Análise jurídica: responsabilidade civil dos influenciadores digitais

Roger Gabriel Rosa¹

No mundo pós-moderno, a estética e a presença digitais ganharam espaço e relevância, sendo as redes sociais uma realidade presente.

Em tempos de pandemia, este cenário digital se intensificou, colocando pessoas e empresas em posições de maior destaque, amplificando opiniões e crenças.

Deixando de lado padrões e critérios sociológicos e antropológicos, as redes sociais já se tornaram um importante canal de comunicação, sob o ponto de vista de criação e desenvolvimento de produtos e serviços, sua colocação à venda, de representatividade, tudo isso numa nova sistemática que exige e requer exposição, mas que também tem estabelecido um espectro de “cancelamentos” e “linchamentos virtuais” cada vez mais crescente.

Como não poderia deixar de ser, restou ao Direito se integrar e acomodar estas novas relações jurídicas, especialmente para tentar amenizar e coibir excessos, garantindo a reparação de danos e sua composição justa.

Projetos de leis são votados e normas gerais amoldadas aos novos fatos e atos surgidos. Há algum tempo, nossos Tribunais também já estão se pronunciando sobre estas situações, dimensionando, dia após dia, as balizas de direitos e garantias a eles atrelados.

Neste sentido, recentemente, o TJSP reconheceu o direito à indenização moral a uma empresa por abusos praticados à sua imagem e bom nome por influenciadora digital, com a consequente determinação de exclusão imediata das postagens e publicações ofensivas de sua rede social.

Na referida decisão², os Desembargadores bem avançaram sobre a questão do limite do razoável e os critérios para a determinação da reparação civil pela influenciadora digital à sociedade empresária ofendida, por “abuso no direito de reclamação”, traçando tais parâmetros e mencionando termos e expressões bem alinhadas ao mundo digital, cabendo destaque para os seguintes trechos:

“É certo que o trabalho realizado pela recorrente e seus colaboradores pode não ter sido realizado a contento, contudo, para a solução desta controvérsia, bastaria que a recorrida, buscasse as vias judiciais para o saneamento desta problemática.

Em nada justificado o uso indiscriminado da internet (e o enorme acervo de seguidores que conquistou) como ringue de batalha, ou ainda como instrumento de “vingança privada”, a ponto de perpetrar verdadeiro “linchamento virtual” contra as recorrentes.

Postura que comporta reprimenda, tanto mais porque das postagens extrai-se também o “deboche” da parte recorrida após ter descoberto o socorro da parte recorrente a este Poder Judiciário.”

Totalmente alinhado com este tema objeto de análise, o acórdão mencionou também outros julgados, a saber:

“Apelação – Ação de indenização por danos morais com pedido de obrigação de fazer e não fazer: abstenção de postagem e publicação de comentários negativos sobre a autora, bem como pleito de remoção de todos os compartilhamentos de publicações negativas sobre a requerente. Ação julgada procedente Veiculação de comentários ofensivos na internet contra a clínica veterinária autora, que prestou serviços ao animal de estimação da ré, que acabou por precisar ser sacrificado – Ré que responsabiliza a autora pela morte de seu animal de estimação, tornando público comentários ofensivos Abuso do direito de livre manifestação do pensamento, com consequente ofensa à imagem e honra objetiva da autora Configuração de danos morais – Sentença mantida Recurso improvido”. (TJSP. Apel. nº 1002803-22.2016.8.26.0278. Des. Relator: Clara Maria Araújo Xavier. 8ª Câmara de Direito Privado. D.J: 25/10/2018)

“Obrigação de fazer. Provedores disponibilizam espaço para reclamações e solução de problemas ligados ao consumidor (“Reclame Aqui” e “Denuncio”). Remoção de reclamo reputado inverídico e ofensivo à imagem dos sócios. Palavras de baixo calão e potencialmente caluniosas que foram editadas pelos provedores. Consumidor que utiliza de subterfúgio para burlar o mecanismo. Vocábulo ofensivo remanescente. Conteúdo que transcende a liberdade de expressão e de crítica. Danos morais configurados. Fixação na quantia de R$ 2.000,00. Valor que atende aos padrões da razoabilidade e proporcionalidade. Dever de diligência dos provedores cumprido. Controle prévio que busca coibir a divulgação de conteúdo depreciativo. Proteção preventiva dos próprios usuários. Conteúdo lícito. Dano moral inocorrente. Sentença parcialmente reformada. Recurso parcialmente provido”. (TJSP. Apel. nº 1016652-18.2013.8.26.0100. Des. Relator: Rômolo Russo. 7ª Câmara de Direito Privado. D.J: 26/04/2017)

“Ação de obrigação de fazer e de não fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais. Consumidor descontente com a política de preços praticada pela autora na comercialização de seus produtos. Descontentamento manifestado por meio de diversas reclamações no site “Reclame Aqui”. Manifestações ofensivas. Excesso configurado. Ofensas que causam prejuízo à imagem da autora, tendo em vista o poder de disseminação no ambiente virtual. Dano moral evidenciado. Montante bem fixado. Critérios de prudência e razoabilidade. Sentença mantida. Recurso principal e adesivo desprovidos”. (TJSP. Apel. nº 0006898-41.2013.8.26.0562. Des. Relator: Mary Grün. 7ª Câmara de Direito Privado. D.J: 30/01/2015)

Assim, o que se extrai deste posicionamento é que, o comprovado excesso no direito à livre manifestação, “justificado” pelo mero descontentamento e potencializado pelo engajamento ou pelo poder de exposição cada vez mais crescente dos influenciadores digitais, pode caracterizar dano moral indenizável, até porque o mundo digital não poderia se dissociar das regras e princípios basilares do ordenamento jurídico, até como forma de pacificação social, no que se insere, inequivocamente.

¹IG: @doutorrosa
²TJSP, Apelação Cível nº 1013048-39.2019.8.26.0003, 10ª Câm. Dir. Priv., Des. Rel. Jair de Souza, j. 20/07/2020

Fevereiro/2021

Dr. Roger Gabriel Rosa

OAB/SP 249.753