A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou nesta quarta-feira (9) um projeto de lei que suspende despejos, remoções e reintegrações de posse, judiciais e extrajudiciais, em todas as cidades do estado durante a pandemia.
O texto prevê que a suspensão ainda valha por mais três meses após o fim das medidas de restrição para combate da Covid-19. Pela lei aprovada agora pela Alesp também ficam suspensas a aplicação e cobrança de multas contratuais e juros de mora em casos de não pagamento de aluguel ou das prestações de quitação dos imóveis residenciais, nos casos afetados pela pandemia no mesmo período.
O texto segue para sanção do governador, João Doria (PSDB) e enquanto isso não ocorrer não há que se falar em eficácia do mesmo. Assim, essa aprovação, no momento não é o que impedirá a execução das decisões judiciais de Reintegração de Posse e/ou despejos.
Projeto de lei n° 146, de 2020
Determina a suspensão do cumprimento de mandados de reintegração de posse e imissão na posse, despejos e remoções judiciais ou extra-judiciais enquanto medida temporária de prevenção ao contágio e de enfrentamento da propagação decorrente do novo coronavírus (COVID-19). A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:
Artigo 1º – Ficam suspensos todos os mandados de reintegração de posse, imissão na posse, despejos e remoções judiciais ou extra-judiciais no Estado do Rio de Janeiro.
Artigo 2º – Ficam suspensas a aplicação e cobrança de multas contratuais e juros de mora em casos de não pagamento de aluguel ou das prestações de quitação dos imóveis residenciais.
Artigo 3º – Estas medidas são válidas enquanto vigorar o estado de emergência na saúde ou de calamidade pública do Estado de São Paulo em razão da pandemia do novo coronavírus (COVID-19) e mais noventa dias após a sua suspensão.
Artigo 4º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Sessões, em 23/3/2020.
Contudo, os proprietários que foram desapossados de suas propriedades e os Locadores de imóveis não tem motivos para alívio, visto que além de ficarem na expectativa da sanção de JOÃO DÓRIA, já devem buscar alternativas contra a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso que 06 dias atrás já havia determinado a suspensão, por seis meses, de medidas semelhantes em todo o território nacional e o fez com base na crise pandêmica, preocupado com a situação das populações vulneráveis e, querendo preservar os executores da medida (policiais, oficiais de justiça, assistente sociais) que estivessem destacados para o cumprimento da ordem.
A necessidade dessas medidas “pega carona” no contexto pandêmico da COVID-19 e, parece que só agora as autoridades judiciárias e governamentais, descobriram que o direito social está diretamente relacionado à proteção da saúde (art. 196, CF). Não só a habitação é essencial para o isolamento social como principal mecanismo de contenção do vírus, mas também para oferecer dignidade a essas pessoas.
É hipocrisia afirmar que excepcionalmente, em razão do surto, os direitos de propriedade, possessórios e fundiários precisam ser ponderados com a proteção da vida e da saúde das populações vulneráveis, dos agentes públicos envolvidos nas remoções e também com os riscos de incremento da contaminação para a população em geral. Ora, com pandemia ou sem pandemia isso sempre deveria ter sido sopesado e as populações vulneráveis estão nessa condição porque antes nada foi feito.
De qualquer forma e porque o poder público sempre se mostra negligente, omisso e inerte, é que o remédio recomendado será muito amargo. Porque se existe população vulnerável, também existem proprietários e empresas que necessitam das áreas e dos imóveis para manterem-se . Então, enquanto se busca a proteção dos vulneráveis, criam-se novos desacertos que irão gerar desempregos e/ou impedir novos postos de trabalho, tirar o alimento de idosos que vivem dos aluguéis. Então o sistema jurídico aliado ao político faz continência com o chapéu alheio e tais medidas não servirão para absolutamente nada, posto que provisórias e de curto período só fomentarão outros problemas judiciais e sociais. Então, o circo está armado novamente e os fantoches continuam sendo a população, o pequeno e médio empresário. A pergunta que deve ser feita à Deputada Leci Brandão , autora do projeto e ao Ministro Barroso, transcorrido o prazo da medida que é, obviamente, temporária, o que será feito da população vulnerável? Em São Paulo elas já tem endereço certo: Praça Princesa Isabel onde algumas dezenas de pessoas montam suas barracas. Em Brasília recomenda-se a Praça dos 03 Poderes.
Enfim, tendo colocado para fora um pouco da indignação, volve-se a questão jurídica e concluí-se que:
i). Ante o quadro tem-se que com relação a ocupações anteriores à pandemia: suspender pelo prazo de 6 (seis) meses, a contar da decisão do STF, medidas administrativas ou judiciais que resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo trabalho individual ou familiar de populações vulneráveis, nos casos de ocupações anteriores a 20 de março de 2020, quando do início da vigência do estado de calamidade pública (Decreto Legislativo nº 6/2020);
ii) com relação a ocupações posteriores à pandemia: com relação às ocupações ocorridas após o marco temporal de 20 de março de 2020, referido acima, que sirvam de moradia para populações vulneráveis, o Poder Público poderá atuar a fim de evitar a sua consolidação, desde que as pessoas sejam levadas para abrigos públicos ou que de outra forma se assegure a elas moradia adequada; e iii) com relação ao despejo liminar: suspender pelo prazo de 6 (seis) meses, a contar da presente decisão, a possibilidade de concessão de despejo liminar sumário, sem a audiência da parte contrária (art. 59, § 1º, da Lei nº 8.425/1991), nos casos de locações residenciais em que o locatário seja pessoa vulnerável, mantida a possibilidade da ação de despejo por falta de pagamento, com observância do rito normal e contraditório. 2. Ficam ressalvadas da abrangência da presente cautelar as seguintes hipóteses: i) ocupações situadas em áreas de risco, suscetíveis à ocorrência de deslizamentos, inundações ou processos correlatos, mesmo que sejam anteriores ao estado de calamidade pública, nas quais a remoção poderá acontecer, respeitados os termos do art. 3º-B da Lei federal nº 12.340/2010; ii) situações em que a desocupação se mostre absolutamente necessária para o combate ao crime organizado – a exemplo de complexos habitacionais invadidos e dominados por facções criminosas – nas quais deve ser assegurada a realocação de pessoas vulneráveis que não estejam envolvidas na prática dos delitos; iii) a possibilidade de desintrusão de invasores em terras indígenas; e iv) posições jurídicas que tenham por fundamento leis locais mais favoráveis à tutela do direito à moradia, desde que compatíveis com a Constituição, e decisões judiciais anteriores que confiram maior grau de proteção a grupos vulneráveis específicos, casos em que a medida mais protetiva prevalece sobre a presente decisão.
[1] Por Márcio Falcão, TV Globo — Brasília
Junho/2021
Regiane Coimbra Muniz de Góes Cavalcanti
OAB/SP 108.852